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27 de Abril de 2024
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    STF desmembra processos de corréus não detentores de foro por prerrogativa de função

    Publicado por Correio Forense
    há 4 anos

    *Claudecy Soares Tavares

    O Estado enquanto ente disciplinador da conduta social, não pode tratar com “privilégios” agentes públicos, por ocasião de seus julgamentos por crimes comuns, sob pena de criar uma casta protegida, que obriga à sociedade a ver crimes levados à prescrição, e a pretensão punitiva esvaziada.

    Muito mais difícil de aceitar, é a aplicação da “atração de competência” sem que seja efetivamente aferido, para cada caso concreto, o prejuízo relevante de detentores desse foro.

    Na linha de entendimento já sedimentado pelo Supremo Tribunal Federal, deve-se proceder, como regra, ao desmembramento dos inquéritos e ações penais originárias no tocante a coinvestigados ou a corréus não detentores de foro por prerrogativa de função, admitindo-se, apenas excepcionalmente, a atração da competência originária quando se verifique que a separação seja apta a causar prejuízo relevante, aferível em cada caso concreto.

    Tem decidido, também, a Corte Suprema, que, considerada a autonomia do delito de organização criminosa, eventuais crimes praticados no âmbito desta não ensejam, necessariamente, o reconhecimento da conexão para processo e julgamento conjuntos. Essa autonomia é extraída da parte final do preceito secundário do tipo previsto no art. da Lei 12.850/2013 (3), na qual o legislador ordinário, após estabelecer a sanção abstrata ao delito de organização criminosa, ressalva as reprimendas correspondentes às infrações penais praticadas pelo grupo organizado.

    Decorre, dessa regra do desmembramento processual no tocante a coacusados não detentores de foro por prerrogativa de função, a natureza excepcional da atração da competência originária, admitida apenas quando se verifique que a separação seja apta a causar prejuízo relevante, aferível em cada caso concreto.

    Nesse sentido:

    “(…) 1. Havendo detentores e não detentores de prerrogativa de foro acusados na mesma causa penal, o atual entendimento desta Suprema Corte aponta no sentido de proceder ao desmembramento como regra, salvo se algum motivo excepcional recomendar o

    julgamento conjunto. 1.1. Desmembramento efetivado no caso concreto, com ressalva do corréu relativamente ao qual imbricada a tal ponto as condutas que inviabilizada a cisão. (…) 4. Queixa-crime não recebida” (INQ 4.034, Rel. Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, Dje 27.4.2017).

    Em decisão do Plenário, mesmo em sede de apuração do crime de organização criminosa, deliberou-se:

    “1. INQUÉRITOS 4.327 E 4.483. DENÚNCIA. INTEGRAÇÃO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E EMBARAÇO ÀS INVESTIGAÇÕES RELACIONADAS AO ALUDIDO DELITO. (…) DESMEMBRAMENTO QUANTO AOS NÃO DETENTORES DE FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. AGRAVOS REGIMENTAIS. (…) 5. DESMEMBRAMENTO DO OBJETO DOS INQUÉRITOS EM RELAÇÃO AOS NÃO DETENTORES DE FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. VIABILIDADE. (…) 5. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal passou a adotar como regra o desmembramento dos inquéritos e ações penais originárias no tocante a coinvestigados ou corréus não detentores de foro por prerrogativa de função, admitindo-se, apenas excepcionalmente, a atração da competência originária quando se verifique que a separação seja apta a causar prejuízo relevante, aferível em cada caso concreto. (…)” (INQ 4.327, AgR-segundo, de minha Relatoria, j. 19.12.2017).

    Adveio, ademais, manifestação do Plenário da Corte Suprema na Questão de Ordem da AP 937 (Rel. Min. ROBERTO BARROSO, julgamento em 3.5.2018) no sentido de delimitar-se o alcance da prerrogativa de foro, para aqueles que a detém, à imputação de crimes cometidos no cargo e em razão do cargo daquele acusado criminalmente. Tal compreensão reforça e convalida a natureza excepcional da competência penal originária concebida constitucionalmente à Corte Suprema.

    Veja-se outros julgados do STF confirmando esse entendimento:

    “A imunidade formal prevista nos arts. 86, caput e 51, I, da Constituição Federal tem por finalidade tutelar o regular exercício dos cargos de Presidente da República e de Ministro de Estado, razão pela qual não é extensível a codenunciados que não se encontram investidos em tais funções. Incidência da Súmula 245 do Supremo Tribunal Federal. 2. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal passou a adotar como regra o desmembramento dos inquéritos e ações penais originárias no tocante a coinvestigados ou corréus não detentores de foro por prerrogativa de função, admitindo-se, apenas excepcionalmente, a atração da competência originária quando se verifique que a separação seja apta a causar prejuízo relevante, aferível em cada caso concreto. 3. Em observância ao princípio da responsabilidade subjetiva que vigora no ordenamento jurídico-penal pátrio, no que tange à acusação do delito de corrupção passiva, caberá ao Ministério Público Federal produzir os elementos de prova capazes de demonstrar, em relação a cada um dos acusados, a perfeita subsunção das condutas que lhes são atribuídas ao tipo penal que tutela o bem jurídico supostamente violado, em especial o seu elemento subjetivo, composto pelo dolo de aceitar promessa e efetivamente receber vantagem indevida em razão da função pública exercida. Por tal razão, o desmembramento não importa em responsabilização indireta do denunciado em relação ao qual a tramitação da denúncia permanece suspensa neste Supremo Tribunal Federal, não sendo possível falar, ainda, em indissolubilidade das condutas denunciadas. 4. Agravo regimental desprovido. (Inq 4517 AgR, Relator (a): Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 23/03/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-098 DIVULG 18-05-2018 PUBLIC 21-05-2018)

    “Cuidam os autos de agravos regimentais interpostos contra decisão proferida de forma conjunta nos autos dos Inquéritos 4.327 e 4.483, por meio da qual, diante da negativa de autorização por parte da Câmara dos Deputados para instauração de processo penal em face do Presidente da República e de Ministros de Estado, determinou-se o desmembramento em relação a diversos coinvestigados não detentores de foro por prerrogativa de função no Supremo Tribunal Federal, com a subsequente remessa à 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba/PR no tocante ao delito de organização criminosa, e à Seção Judiciária do Distrito Federal/DF no que diz respeito ao crime de obstrução às investigações envolvendo organização criminosa, para prosseguimento nos ulteriores termos. […] A imunidade formal prevista nos arts. 86, caput e 51, I, da Constituição Federal tem por finalidade tutelar o regular exercício dos cargos de Presidente da República e de Ministro de Estado, não sendo extensível a codenunciados que não se encontram investidos em tais funções. Incidência da Súmula 245 do Supremo Tribunal Federal. Agravos regimentais desprovidos. 5. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal passou a adotar como regra o desmembramento dos inquéritos e ações penais originárias no tocante a coinvestigados ou corréus não detentores de foro por prerrogativa de função, admitindo-se, apenas excepcionalmente, a atração da competência originária quando se verifique que a separação seja apta a causar prejuízo relevante, aferível em cada caso concreto. Na espécie, a proposta acusatória afirma a existência de uma única organização criminosa, composta por distintos núcleos operacionais, dentre os quais o integrado por políticos afiliados a diversos partidos. Cuidando a denúncia do núcleo político de organização criminosa composto por integrantes do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) com atuação na Câmara dos Deputados, os autos devem ser remetidos à livre distribuição à Seção Judiciária do Distrito Federal/DF. Em relação ao agravante André Santos Esteves, os autos devem ser direcionados especificamente à 10ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, em razão de investigação prévia ali deflagrada. Vencido o relator neste ponto, concernente ao juízo destinatário da remessa, eis que o voto em sua formulação originária (vencida) propôs o envio à 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba/PR. Em observância ao princípio da responsabilidade subjetiva que vigora no ordenamento jurídico-penal pátrio, no que tange à acusação do delito de organização criminosa, caberá ao Ministério Público Federal produzir os elementos de prova capazes de demonstrar, em relação a cada um dos acusados, a perfeita subsunção das condutas que lhes são atribuídas ao tipo penal que tutela o bem jurídico supostamente violado, em especial o seu elemento subjetivo, composto pelo dolo de promover, constituir financiar ou integrar organização criminosa. Por tal razão, o desmembramento não importa em responsabilização indireta dos denunciados em relação aos quais a tramitação da denúncia permanece suspensa neste Supremo Tribunal Federal, não sendo possível falar, ainda, em indissolubilidade das condutas denunciadas. Tendo em vista que o suposto delito de obstrução às investigações relacionadas ao crime de organização criminosa teria sido praticado, em grande parte, na Capital Federal, devem os respectivos autos também ser remetidos para processamento perante a Seção Judiciária do Distrito Federal/DF.

    […] Com o desmembramento do feito determinado em relação aos não detentores de foro por prerrogativa de função, não mais subsiste competência ao Supremo Tribunal Federal para avaliar a idoneidade dos elementos de informação até então produzidos e perquirir a justa causa à continuidade das investigações ou para a propositura de ação penal em relação a cada um dos investigados, o que, atualmente, encontra-se a cargo dos respectivos juízos competentes. Agravos regimentais não conhecidos. 7. Tratando-se de figura penal dotada de autonomia, o delito de organização criminosa não se confunde com os demais praticados no seu âmbito, razão pela qual o desmembramento realizado nestes autos não tem o condão de configurar o indevido bis in idem em relação a eventuais ações penais ou inquéritos em trâmite perante outros juízos. Agravo regimental desprovido. 8. A alegação de negativa de prestação jurisdicional fica prejudicada com a inclusão em pauta da insurgência que a defesa requer a análise antes da baixa dos autos ao primeiro grau de jurisdição. Agravo regimental prejudicado. (STF – Inq 4327 AgR-segundo, Relator (a): Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 19/12/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-161 DIVULG 08-08-2018 PUBLIC 09-08-2018)

    “Restrições ao processamento de foro por prerrogativa de função determinadas por cortes estaduais quando não se verifique que a separação seja apta a causar prejuízo relevante, aferível em cada caso concreto, reflete a orientação sedimentada no Supremo Tribunal Federal, que “passou a adotar como regra o desmembramento dos inquéritos e ações penais originárias no tocante a coinvestigados ou corréus não detentores de foro por prerrogativa de função” (INQ 4.327, AgR-segundo, Rel. Min. Edson Fachin, Dje 9.8.2018). (Pet 7512, Relator (a): Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 20/11/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-261 DIVULG 04-12-2018 PUBLIC 05-12-2018).

    Na corrida por um sistema jurídico mais justo e equânime para todos os integrantes da sociedade, a aplicação da atração de competência deve ser uma exceção, onde o Judiciário cada vez mais se afaste desse injusto “privilégio” por prerrogativa de foro.

    *Advogado Claudecy Tavares Soares/OAB-PB 6041, ex-Conselheiro da OAB/PB e Professor de Direito Processual Civil.

    #corréus #codenunciados #desmembramento #processo #organização #criminosa #foro #prerrogativa #função #competência

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