Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
19 de Abril de 2024

STJ exige prova de ‘esforço’ na hora de dividir bens

Publicado por Correio Forense
há 8 anos

STJ exige prova de esforo na hora de dividir bens

Decisão do STJ, de que a partilha do patrimônio de casal que vive em união estável deixa de ser automática, vai exigir esforço das partes para provar que têm direito à divisão dos bens.

“Vou relatar o caso do mesmo jeito que o escutei. O executivo chegou alterado no meu escritório: ‘Doutor, me casei com uma mulher-tsunami. Ela chegou para mim cheia de onda e, quando o casamento acabou, saiu levando carro, casa e apartamento. Agora que arranjei outra moça, quero evitar passar pelo mesmo dissabor’”, conta o advogado José Roberto Moreira Filho, diretor do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFam), sem revelar nomes nem poupar o tom machista da narrativa. Dançando conforme a música, o especialista recomendou ao cliente lavrar em cartório um pacto de convivência, estipulando regras de partilha para o segundo relacionamento em união estável, a ser assinado por ambas as partes. O documento estabelecia que, em caso de separação, apenas imóveis comprados em nome do casal seriam repartidos entre os dois e, ainda, que, nos dois anos seguintes, a ex-companheira receberia dois salários mínimos mensais como pensão alimentícia.

Se prevalecer a nova decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que divulgou na última terça-feira que a partilha do patrimônio de casal que vive em união estável deixa de ser automática, mudaria tudo. O tal executivo poderia até dispensar tantos cuidados ao ‘juntar os trapos’, como se diz no popular. A partir do acórdão, que está para ser publicado, cada convivente tem de provar que contribuiu “com dinheiro ou esforço” para ter direito à divisão dos bens. Procurada pela reportagem do Estado de Minas, a assessoria do STJ confirmou a existência desse acórdão, mas evitou antecipar o conteúdo, “por se tratar de segredo de Justiça”. Só as partes envolvidas têm acesso aos termos da decisão, por enquanto. Outras mudanças podem ser esperadas a partir da inclusão do Estatuto da Família, que entrou em pauta no Congresso Nacional na última semana.

“Se for isso mesmo, a decisão vai afetar pessoas que vivem em união estável e não fizeram contrato por escrito. Em caso de separação, cada uma das partes terá de provar que ajudou a pagar pelo bem adquirido depois da convivência em comum”, compara o advogado, esclarecendo que a compra de imóveis poderá ser feita em nome dos dois compradores, deixando clara a intenção de dividir o apartamento. Caso contrário, se não houver contrato pré-nupcial e prevalecer o novo entendimento do STJ, a posse da casa ou do apartamento poderá ficar apenas com quem assinou pelo imóvel na data da compra, a não ser que o (a) companheiro (a) consiga comprovar que fez o papel de suporte da relação, cuidando dos filhos enquanto o outro trabalhava fora, por exemplo.

RETROCESSO

É dessa maneira que o advogado de família Rachid Silva interpreta a nova decisão do STJ, passados 25 anos da Lei 9.489, que mandou estender o regime da comunhão parcial de bens às chamadas uniões estáveis, que, de certa forma, se tornaram equiparadas ao casamento. “Na minha opinião, é como se o STJ estivesse criando uma família de segunda categoria, o que deve ser rechaçado pelos juristas. Essa decisão vai reacender uma fogueira que já havia sido apagada, ao pacificar o entendimento de que prevaleceria o ‘esforço comum’ nos dois tipos de relacionamento”, afirma Rachid. Ele desconfia que a nova decisão poderá ser rejeitada pelos especialistas, que poderão alegar, inclusive, a inconstitucionalidade do recurso, tomando por base o regime de comunhão parcial definido pelo Código Civil, em vigor desde 2003.

O maior risco, segundo Rachid, é voltar atrás na antiga discussão sobre se, ao se juntar em uma união estável, já está presumido que o casal fez um ‘esforço comum’ para constituir uma família ou se, conforme ocorria antes, o empenho de cada um precisará ser comprovado. “É um abalo para ser considerado o regime parcial de bens”, acredita o advogado, lembrando que, como é hoje, a figura do casamento pressupõe o regime parcial de bens, ou seja, serão divididos igualmente os bens adquiridos depois da data da cerimônia no cartório. Da mesma forma, a união estável imita o casamento, prevendo regime parcial de bens, desde que não seja lavrado um contrato pré-nupcial entre as partes.

Uma mão na frente e outra atrás

Autor do Código Civil Anotado, livro que está na décima edição, discutindo os mais diversos tipos de relacionamento aos olhos do direito de família, o advogado Rodrigo da Cunha é voz dissonante da maioria dos ditos familiaristas. O presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFam) defende que deve haver, sim, distinção clara entre o casamento e a união estável, para além da nomenclatura de cônjuge e companheiro, respectivamente. “Tem gente que acha que deve ser igual e que a união estável foi evoluindo a ponto de se equiparar ao casamento. Para mim, nem um nem outro é melhor ou pior, mas deveriam continuar sendo diferentes”, afirma o advogado, que vê com reservas o limite da interferência do Estado na relação a dois.

Cunha é um dos defensores da tese de que deve haver distinção entre o casamento e a união estável, até para permitir liberdade e autonomia aos pares. “É um paradoxo o Estado ter o poder de casar as pessoas que estão morando juntas”, questiona. Ele acredita que a nova decisão do STJ não terá muitos adeptos entre os casais, mas vai permitir retomar a discussão sobre os papéis de cada tipo de relacionamento. “A decisão vai abrir precedente para que as pessoas possam repensar as diferenças. O direito de família está sempre mudando”, diz.

Para o diretor do IBDFam, José Roberto Moreira Filho, casais que decidem morar juntos deveriam reduzir as interrogações, fazendo uma consulta prévia para estabelecer os termos concretos do relacionamento, da pensão alimentícia e, principalmente, da sucessão. “Como está hoje a lei, os direitos do casamento são quase os mesmos da união estável. A maior diferença ocorre quando um dos parceiros morre. A união estável é a menos recomendada. Nela, a companheira do homem rico, que nada adquiriu durante a união, sairá com uma mão na frente e outra atrás.”

“Sob a ótica do direito sucessório”, continua o advogado, “se o homem morrer sem deixar filhos, apenas uma terça parte dos bens da união estável ficará com a mulher. Já no casamento, quando um dos parceiros morre, a viúva herdará toda a herança, caso não haja descendentes. Nas minhas aulas, costumo dizer que a união estável é recomendada para quem escolhe se casar com o parceiro que nada tem, mas é estudioso e trabalhador. Se ele morrer, os bens adquiridos durante o relacionamento serão preservados.”

Sandra Kiefer Fonte: Estado de Minas

  • Publicações23551
  • Seguidores639
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoNotícia
  • Visualizações6767
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/stj-exige-prova-de-esforco-na-hora-de-dividir-bens/360025004

Informações relacionadas

Tribunal de Justiça de São Paulo
Jurisprudênciahá 2 anos

Tribunal de Justiça de São Paulo TJ-SP - Apelação Cível: AC XXXXX-88.2015.8.26.0127 SP XXXXX-88.2015.8.26.0127

Superior Tribunal de Justiça
Jurisprudênciahá 9 anos

Superior Tribunal de Justiça STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL: AgRg no AREsp XXXXX SC XXXX/XXXXX-2

Bernardo César Coura, Advogado
Notíciashá 8 anos

STJ exige prova de 'esforço' na hora de dividir bens

Elisa Azevedo de Oliveira, Advogado
Modeloshá 4 anos

[Modelo] Acordo de Constituição e Dissolução de União Estável c/c Partilha de Bens, Alimentos, Guarda e Convivência

9 Comentários

Faça um comentário construtivo para esse documento.

Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)

Esta decisão do STJ servirá de exemplo a muitos golpistas. O casal deve ter o direito de escolher o que pretende. Se vivem por vários anos sem qualquer compromisso, é porque assim o quiseram. De um lado um, independente de ser homem ou mulher, não vê no parceiro compromisso suficiente para ser chamado de casal, pois, se assim o fosse, casaria com o mesmo ou assinaria termo a respeito. Outrossim, se acho que o outro deva receber alguma coisa sua, mesmo em união estável, adquire em nome de ambos ou deixa um testamento. Cabe assim, aquele que deseja estabilidade após a separação ou falecimento, convencer o outro que devem assinar o termo de regularização, pondo fim assim, a diversos processos que sobrecarregam o judiciário! continuar lendo

Concordo. Conheço casos em que a mulher juntou levando filho de relação anterior. A pessoa deu nome para o filho e passados alguns anos e mulher arrumou amante e ainda entrou com pedido de pensão e bens. Golpes existem, de ambos lados, portanto, a prudencia de olhar cada caso sempre será necessária. continuar lendo

Já li vários textos sobre esse assunto, mas vejo que todos não se preocuparam em verificar realmente o que decidiu o STJ. Essa decisão não se aplica a todos os casos indistintamente, mas somente para aqueles casos que há obrigatoriamente o regime de separação de bens, nos termos do que preceitua o art. 1641 do CC. Portanto, essa decisão não se estende a todos os casos de união estável, mantendo-se o mesmo entendimento nos demais casos, não havendo que se falar em alteração/mudança de entendimento do STJ. continuar lendo

Como já destacado por alguns colegas, essa decisão será afeta aos casos em que há separação obrigatória de bens.
Agora, eu gostaria de abrir um novo flanco nessa discussão: o que é "esforço comum"?
Porque - na prática - esse esforço comum pode ser verificado por uma miríade de situações diferentes, desde do caso em que um fica em casa e cuida dos filhos e da casa para que o outro possa trabalhar até o caso em que ambos exercem atividade remunerada, tenham eles vencimentos equivalentes ou não.
Assim, sou da humilde opinião de que, a menos que um dos cônjuges não passe de um bibelô, sustentado e mantido pelo outros, SEMPRE haverá esforço comum.
Ainda assim, lembro de um sentença que li (a muitos anos) de um caso de um rico empresário que alegava que a companheira não contribuíra em nada para o patrimônio do casal, já que ele tinha criados para todas as atividades domésticas e não tinham filhos, de modo que a esposa passava os dias em passeios, compras e academia,
A sentença, no entanto, reconheceu o esforço comum da mulher, alegando que esse se configurava exatamente na forma como ela se portava: estava sempre linda, gostosa, cheirosa, malhada e bem vestida, e isso se constituía em forte contraponto às stressantes atividades laborais do varão, auxiliando-o a manter uma vida psicologicamente equilibrada. Durma-se com um barulho desses... continuar lendo

Concordo com o posicionamento do Dr. Rodrigo da Cunha. União estável e casamento devem continuar seguindo cada um em seu quadrado. Quem quer se casar, procura o cartório e faz tudo conforme manda o figurino, preservando direitos seus. Por outro lado, quem opta pela união estável já demonstra o desinteresse pelo casamento, pelo documento, pela segurança e estabilidade que o mesmo confere aos casais, o que por si só, já o diferencia da união estável, que ocorre sem qualquer formalidade. continuar lendo